A predominância de casas entre as moradias em São Paulo está com os dias contados. Um estudo divulgado nesta semana com dados compilados pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM), ligado à USP e à Fapesp, aponta que as residências verticais ultrapassaram as horizontais em área total construída e estão praticamente empatadas em número de unidades habitacionais em meio a um crescimento acentuado.
O estudo utilizou como base os dados de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de 2000 a 2020, com base nas classificações da Prefeitura para o que são residências horizontais (“térreas e assobradadas, com ou sem subsolo”) e verticais (em “prédios de apartamentos”), de acordo com as Leis Tributárias do Município de São Paulo. Ele não inclui, portanto, habitações que não pagam o imposto municipal.
Em 20 anos, a área construída residencial subiu 38,44%, de 386,3 milhões de metros quadrados, em 2000, para 534,8 milhões de metros quadrados, em 2020. Aumento semelhante foi identificado no número total de unidades habitacionais paulistanas, de cerca de 2,53 milhões para 3,43 milhões, o que significa um crescimento de 35,57%.
O crescimento de residências foi puxado pelos apartamentos, que foram de um total de 735 mil para 1,375 milhão no período, um aumento de 87%. Por outro lado, as horizontais aumentaram menos, 12%, de 1,228 milhão para 1,376 milhão.
Outro dado é que há menos terrenos vazios e/ou ociosos na cidade. A quantidade total deles foi de aproximadamente 140 mil para 106 mil em 20 anos, uma queda de 24,28%. “São Paulo está cada vez mais vertical”, resume Eduardo Cesar Leão Marques, diretor do CEM e professor do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), da USP. Ele assina a nota técnica em conjunto com o pesquisador Guilherme Minarelli.
“A verticalização pode significar estresse sobre a infraestrutura, a depender da região da cidade, mas em si não é negativa, ainda mais em uma cidade tão horizontal (com grande território) quanto São Paulo”, comenta o professor. Como é destacado na nota técnica, essa tendência de verticalização já havia sido apontada de 1991 a 2006 pelo pesquisador Tomás Wissenbach, mas agora está mais visível.
A quantidade de terrenos ociosos esteve em queda quase ininterrupta entre 2000 e 2020, com exceção do período próximo da aprovação da atual lei de zoneamento (que é de 2016). Entre aquele ano e 2017, a cidade ganhou 4,5 mil terrenos adicionais.
“É um momento em que o mercado imobiliário ficou à espera (para aguardar se a mudança legislativa seria benéfica), segurou lançamentos, mas se preparou”, interpreta Marques. Outro fator que contribui para a interpretação é houve uma pequena queda no número de imóveis horizontais pouco antes, de 1,353 milhão (2015) para 1,325 milhão (2016).
No geral, contudo, o professor diz que os dados sugerem um “efeito pequeno” dos planos diretores e das leis de zoneamento dos últimos 20 anos. “As curvas continuam mais ou menos com a mesma inclinação (mesmo após as mudanças legais).” Isso decorre também da quantidade proporcionalmente superior de imóveis já existentes em relação aos recém-entregues.
Outras características dos imóveis também mudaram. Se antes a predominância era de unidades de baixo padrão, agora ela é de padrão médio. O crescimento proporcionalmente foi ainda maior em apartamentos de alto padrão (embora não sejam maioria numericamente).
O entendimento do que é baixo, médio e alto padrão utilizado pelo estudo tem como base as classificações do IPTU, embora tenham nomes distintos dos utilizados nas Leis Tributárias do Município de São Paulo. Entre as características típicas de uma residência de baixo padrão, por exemplo, estão a “arquitetura modesta”, “esquadrias pequenas e simples de ferro ou madeira” e uma área bruta de até 120 metros quadrados e dois pavimentos (se horizontal) ou até 85 metros quadrados (se vertical).
O padrão médio tem, por sua vez, “arquitetura simples”, “esquadrias comuns de ferro, madeira ou alumínio” e, geralmente, até dois pavimentos e 300 metros quadrados (no caso de horizontal) ou até 200 metros quadrados (apartamentos). Por fim, os de “alto padrão” tem “arquitetura com estilo e forma” ou com “projeto arquitetônico especial e personalizado”, dentre outras características.
“O baixo padrão cresce também, mas muito menos que o resto”, aponta o professor. Por isso, interpreta haver uma “elitização” da moradia vertical.
Ele destaca, ainda, que esse tipo de dado pode ajudar na discussão e elaboração de políticas públicas, tanto que existem em nível nacional em países como Chile, Inglaterra e Estados Unidos. Neste ano, a cidade de São Paulo está em processo de revisão do Plano Diretor, por exemplo.
Ao comentar os resultados do estudo, o urbanista Kazuo Nakano, professor do Instituto das Cidades da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), comenta que a verticalização da cidade se tornou visível nos últimos 20 anos. Isso ocorreu especialmente entre 2009 e 2011 e após a lei de zoneamento de 2016.
Ele pondera, contudo, que o aumento das residências verticais pode estar vinculado também a reclassificações e regularizações de imóveis já existentes, além de novas construções. “Mas é evidente que a cidade tem se compactado mais em termos construtivos, com uma verticalização também na periferia.”
Na avaliação do professor, um fator que precisa ser melhorado na verticalização paulistana é a “urbanidade”. Isto porque grande parte dos novos edifícios são torres no meio de terrenos, isoladas da rua por muros e de uso estritamente residencial.
No urbanismo, contudo, o entendimento é que imóveis mais próximos da calçada e com comércio e serviços no térreo aumentam o fluxo de pessoas nas vias públicas e até mesmo contribuem para a sensação de segurança. Um exemplo são os edifícios paulistanos anteriores à década de 1970, como os vistos até hoje nos bairros paulistanos centrais.
Ele salienta, contudo, que esse padrão construtivo tem mudado lentamente. Um dos motivos é que o uso misto e a fachada ativa (comércio e afins no térreo) são incentivados pelo atual Plano Diretor.
FONTE:
MSN NOTÍCIAS